A Holding é para todos?

Não raro os clientes interessados em planejamento sucessório, ao adentrarem os escritórios de seus advogados de família, já têm em mente a ideia de constituir uma holding familiar, dada a notória divulgação que esse instrumento de planejamento patrimonial conquistou nos últimos anos e o benefício que proporcionam na proteção do patrimônio das famílias e suas empresas.

O planejamento sucessório por meio da utilização da holding familiar reclama conhecimentos especializados de diversos ramos do Direito: do Direito de Família e Sucessões, do Direito Empresarial, do Direito Tributário, do Direito Civil, dada a complexidade de questões que essa solução enfeixa.

Em que pese o senso comum trate a holding como um tipo societário, na realidade, a holding é, tão-somente, o objeto social de uma empresa cuja finalidade é
outras sociedades, com regência no §3o do art. 2o da e que, portanto, poderá se revestir de qualquer dos tipos societários previstos na lei civil, podendo ser uma limitada ou uma sociedade anônima, apenas para mencionar as duas espécies mais comumente escolhidas. Para fins desse artigo, vamos considerar a sociedade limitada, o tipo mais escolhido, referindo-se às participações societárias como quotas-socias.

A constituição de holding é, sem sombra de dúvida, uma excelente ferramenta de planejamento sucessório para assegurar a organização e perpetuidade do patrimônio da família, quer sejam empresárias ou não, porém, atender o desejo do cliente, no sentido de criar uma empresa controladora do patrimônio familiar, vai depender de uma análise detalhada de risco e de um estudo de viabilidade, considerando-se as variáveis de cada família. Significa dizer que, nem sempre esse é o remédio adequado para prevenir ou resolver os males de certas famílias e de seus negócios. Por vezes, a melhor prescrição está em outro instrumento.

Matéria divulgada pela Revista Exame refere que, segundo relatório do Banco Mundial 30 % das empresas familiares chegam à segunda geração e menos da metade desse percentual atingem a terceira geração , o que confere total sentido ao anseio dos planejadores, já que uma sucessão planejada cuidadosamente, com a devida antecedência, propicia a identificação entre os familiares, daqueles com mais aptidão para seguir à frente dos negócios da família e treiná-los para tanto, com o know how sendo entregue diretamente pelo patriarca, ainda em vida, o que fortalece a admiração pela geração anterior. Ao mesmo tempo, evita-se a súbita interrupção da administração do negócio quando os planejadores vierem a faltar, reduzindo o impacto da perda na vida da família e no próprio negócio da empresa.

A escolha de realizar planejamento sucessório mediante constituição da assim chamada holding familiar, realiza-se com a transferência de bens da pessoa física para a empresa constituída em integralização de capital que irão compor quotas sociais a serem transferidas aos herdeiros, passando o patrimônio a ser administrado por essa nova estrutura societária.

Um planejamento bem concebido deve principiar por um olhar sensível e empático sobre a família como um todo, levar em conta que os atuais sucessores, cedo ou tarde, terão seus próprios núcleos familiares, o que importa, em geral, em formar uma descendência e no ingresso na família de pessoas estranhas, em virtude dos laços da conjugalidade ou convivência, com possível interferência nas relações empresariais, ciclo esse que se renova a cada geração.

É possível, a partir dessas realidades, criar estratégias para evitar ou reduzir os riscos de disputas familiares que venham a atingir a estrutura empresarial e que irão se refletir no ambiente de trabalhado, em meio a fornecedores, consumidores e na comunidade em geral, causando prejuízo à reputação da empresa.

Conflitos de poder, no ambiente interno da sociedade, podem ser minimizados com a instituição de quotas preferenciais, das quais é retirado ou limitado o direito de voto e, em seu lugar, como compensação, concedidas vantagens pecuniárias a seus titulares, harmonizando-se os interesses familiares.

Por outro lado, questões existenciais como a existência de herdeiro vulnerável, pessoa com deficiência, ou dependente químico, por exemplo, podem ser minimizadas instituindo-se em favor destes proteção especial, tais como a inclusão de disposição patrimonial para ser utilizada em tratamento e destinação de renda mensal vitalícia, dentre outras medidas.

A holding familiar pode alcançar às famílias uma sucessão mais facilitada, já que no caso do planejador haver integralizado bem no capital social da holding, o monte-mor será constituído por quotas sociais e não bens imóveis, que geram indesejáveis condomínios forçados entre herdeiros, e que, ademais, ao tempo da sucessão, já deverão estar divididas entre os herdeiros, de conformidade com a vontade do planejador.

Quanto à propagada eficiência tributária, tal circunstância merece detida análise, caso a caso, o que importa num prévio estudo de impactos tributários, em condições de aferir se os diversos atos praticados no âmbito da holding, não acarretarão a incidência de alíquota superior, resultando, ao final, em desvantagem tributária.

Importa, nesse contexto, que os patriarcas estejam cientes desse risco para que possam decidir se, ainda assim, o interesse em perpetuar o patrimônio se sobrepõe a essa desvantagem e persistem no propósito de constituir a sociedade ou se preferem escolher outra forma de planejamento que equilibre melhor a proteção desse patrimônio e as vantagens tributárias.

Referências Bibliográficas:

CARDOSO, Simone Tassinari. Planejamento Sucessório: A Holding familiar e o Trust. In: TARTUCE, Flávio; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (coord). Tratado de Direito das Sucessões.Belo Horizonte: Instituto Brasileiro de Direito de Família- IBDFAM, 2023.

CARDOSO, Simone Tassinari; TREMARIM JUNIOR, Valter. Reflexões sobre holding no planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves (coord). Arquitetura do Planejamento Sucessório. 2a ed. Belo Horizonte: Forum, 2019.

GONÇALVES, Oksandro; CAMINHA, Anelize Pantaleão Puccini. As quotas preferenciais na sociedade limitada como instrumento para o planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves (coord). Arquitetura do Planejamento Sucessório. 2a ed. Belo Horizonte: Forum , 2019.

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